Moisés e o Monoteísmo: A Religião e a Identidade Cultural no Volume 19 de Sigmund Freud
Autor: Márcio Gomes da Costa, Psicanalista, Analista do Comportamento Aplicada e Psicopedagogo
Palavras-chave: Moisés, monoteísmo, Freud, religião, identidade cultural.
Este artigo explora as contribuições desse volume para a teoria psicanalítica e a compreensão da religião, discutindo as implicações da teoria de Freud para a identidade cultural e as raízes inconscientes do monoteísmo.
Desenvolvimento
Freud inicia o Volume 19 com uma análise histórica de Moisés, sugerindo que ele não era um hebreu, mas sim um nobre egípcio que foi influenciado pela religião monoteísta de Aton, introduzida pelo faraó Akhenaton. Freud argumenta que Moisés adotou o monoteísmo e tentou impor essa nova religião ao povo hebreu, que na época era politeísta. Esta teoria desafia as narrativas tradicionais e sugere que o monoteísmo foi uma inovação religiosa imposta por uma figura externa.
Um dos conceitos centrais deste volume é a ideia de que a religião monoteísta tem profundas raízes no inconsciente coletivo. Freud sugere que o monoteísmo representa um movimento em direção à centralização e unificação das forças divinas, refletindo uma necessidade psíquica de ordem e controle. Ele argumenta que a transição para o monoteísmo foi um processo traumático para o povo hebreu, pois envolveu a renúncia de antigas crenças e a adoção de uma nova identidade cultural.
Freud também explora o conceito de parricídio no contexto da religião monoteísta. Ele sugere que a rejeição de Moisés pelos hebreus e sua eventual morte simbolizam um parricídio psíquico, onde a figura paterna (Moisés) é rejeitada como parte do processo de formação de uma nova identidade cultural. Freud relaciona esse parricídio ao complexo de Édipo, onde o filho deve superar o pai para desenvolver sua própria identidade. No caso do monoteísmo, esse processo foi internalizado na religião e na cultura do povo judeu.
Outro tema importante discutido no Volume 19 é a repressão do trauma religioso. Freud sugere que o trauma da transição para o monoteísmo foi reprimido no inconsciente coletivo dos judeus, mas continua a influenciar a identidade cultural e religiosa até os dias atuais. Ele argumenta que essa repressão é responsável por muitos dos conflitos internos e externos experimentados pelo povo judeu ao longo da história.
Freud também discute a ideia de que o monoteísmo introduziu uma nova forma de culpa e responsabilidade no inconsciente coletivo. Ao adotar um Deus único e omnipresente, os hebreus internalizaram um superego coletivo que impõe padrões morais elevados e uma sensação constante de vigilância divina. Freud sugere que essa internalização da autoridade divina contribuiu para o desenvolvimento de um senso de culpa mais profundo e de uma ética mais rigorosa, que são características centrais do judaísmo.
O Volume 19 também inclui uma análise das consequências psíquicas da adoção do monoteísmo. Freud sugere que a crença em um Deus único e poderoso oferece segurança e estabilidade, mas ao mesmo tempo impõe uma responsabilidade psíquica pesada. A relação com esse Deus único é caracterizada por amor e temor, criando uma tensão interna que influencia a vida psíquica dos indivíduos e a coesão social.
Freud utiliza exemplos históricos e culturais para ilustrar como a adoção do monoteísmo moldou a identidade do povo judeu e influenciou outras religiões monoteístas, como o cristianismo e o islamismo. Ele sugere que o monoteísmo, ao centralizar a figura divina, promoveu a ideia de uma verdade absoluta e inquestionável, o que teve profundas implicações para o desenvolvimento da civilização ocidental.
Outro ponto central abordado neste volume é a resiliência cultural do judaísmo. Freud observa que, apesar das perseguições e desafios ao longo da história, a identidade cultural e religiosa dos judeus permaneceu intacta, em grande parte devido à força do monoteísmo e das tradições associadas a ele. Ele sugere que essa resiliência é um testemunho do poder das crenças religiosas enraizadas no inconsciente coletivo.
Freud conclui o Volume 19 sugerindo que, embora sua teoria sobre Moisés e o monoteísmo seja especulativa, ela oferece uma nova maneira de entender a religião e a identidade cultural. Ele propõe que a psicanálise pode ser uma ferramenta valiosa para explorar as raízes inconscientes das crenças religiosas e para compreender os conflitos e tensões que surgem na interface entre o indivíduo e a cultura.
Este volume é essencial para profissionais e estudantes de psicanálise, bem como para aqueles interessados na história da religião e na identidade cultural. Ao reler este volume, podemos apreciar as contribuições de Freud para a compreensão da religião como um fenômeno psíquico e cultural.
Referência
FREUD, Sigmund. Volume 19. Obras Completas.

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